INTRODUÇÃO

Tem ganhado cada vez mais destaque cotidianamente a necessidade de se realizar um planejamento patrimonial e sucessório eficiente para evitar conflitos futuros entre os herdeiros, assim como a perda do patrimônio para custeio de despesas com inventário (imposto, honorários de advogado, taxas de cartório, emissão de certidões, etc.) após o falecimento de seu titular, já que se trata de procedimento obrigatório para viabilizar a partilha e a transferência dos bens do falecido aos sucessores.

Dentro deste cenário, dentre as técnicas previstas para planejamento sucessório, vem recebendo conhecimento a abordagem da chamada holding familiar como método seguro e eficaz para garantir a doação dos bens em vida aos herdeiros, mediante utilização de mecanismos e técnicas que permitem a economia e até mesmo a supressão de gastos futuros, podendo gerar em alguns casos economia de até 90 % dos custos em comparação ao inventário.

Mas afinal de contas, o que é holding familiar?

Primeiramente, é preciso atentar para a etimologia da palavra holding, que vem do verbo to hold, dos países anglicistas, que significa segurar, reter, controlar e manter, aparecendo com maior expressão no período das Revoluções Industriais ocorridas nos século XVIII na Inglaterra e nos Estados Unidos, fase histórica em que os processos de manufaturação de produtos em escala industrial começaram a se sofisticar a ponto de gerar divisão de departamentos ou setores autônomos dentro de cada linha produção, gerando a necessidade de se estabelecer a criação de companhias autônomas para cuidar de cada setor específico da atividade industrial, como fábrica, depósito, logística e relações humanas, e sobretudo, a criação de uma entidade controladora de todos os integrantes da setorização de etapas da cadeia industriária, chamada de Holding Company.

A ideia essencial e originária da holding é fundamentalmente ser uma empresa controladora de outras empresas, o que se instrumentaliza através de participação societária do quadro social das entidades coletivas, sendo regulamentada no Brasil através do artigo 2º, § 3º, da Lei n. 6.404/1976, ou seja, a Lei das Sociedades Anônimas.

A rigor, a holding, entendida como empresa controladora de outras, sendo assim a base dos agrupamentos econômicos, sempre teve uma marca acentuadamente corporativa e atrelada a setores mais nichados e específicos da economia, versando sobre conglomerados empresariais que aportam vultosos investimentos em atividades de produção em larga escala a nível global, lançando mão de outros meios como atuação no mercado de capitais para captação de recursos através de subscrição de ações para alavancagem de investimentos e receitas.

As grandes corporações empresariais usualmente demandam a conjugação de estratégias financeiras e patrimoniais para a preservação da saúde e regularidade de suas atividades, de forma a evitar que mudanças drásticas nos campos político, cambiário, fiscal, alfandegário, legislativo e jurisprudencial, assim como oscilações nas leis básicas da oferta e procura em escala global no contexto da macroeconomia as afetem desastrosamente.

Neste aspecto, começou-se a verificar que muitas destas táticas acabaram por refletir na adoção de mecanismos para projetar a continuidade dos negócios das famílias controladoras destas grandes empresas no caso de o fundador não puder mais ditar as decisões sobre os rumos das atividades, preparando os herdeiros para a adaptação do contexto empresarial, de forma a eliminar a falência da corporação por falta de gestão estratégica e definição de atribuições de como os relacionamentos com fornecedores, clientes, investidores e bancos.

Neste sentido, advogados com notório conhecimento em direito societário, em alinhamento com profissionais especialistas em gestão tributária, contábil e financeira, sempre foram frequentemente requisitados para orquestrar uma engenharia jurídica para viabilizar a blindagem patrimonial e a sucessão da atividade empresarial para o caso de o fundador vier a falecer, e organizar a partilha do patrimônio empresarial e até mesmo pessoal dos sócios ainda em vida, métodos estes que seguem na vereda na antecipação de riscos e conflitos futuros, prevenindo a higidez financeira empresarial contra revezes futuros, dentre eles a burocracia e os elevados custos decorrentes do inventário, que podem corroer significativa parcela do patrimônio da família, além de resvalar na desorganização do legado constituído por décadas de muito trabalho e dedicação para a consolidação do mercado, colocando em risco a credibilidade empresarial.

Com o passar dos anos, especialmente após a repercussão prática da aplicação dos preceitos normativos previstos na Lei de Sociedades Anônimas na organização das sociedades empresárias no Brasil, verificou-se que as estratégias societárias, como criação de holdings voltadas ao controle e participação em outras empresas, além da predefinição da partilha em vida e manutenção de atribuições por parte do patriarca/matriarca no controle dos negócios da família até sua morte, são consideravelmente úteis e eficazes na organização patrimonial e na partilha de bens em vida de famílias que não estão sob a égide do mundo corporativo, pelo que tem se destacado a utilização das modernas técnicas para evitar os inconvenientes do inventário.

Verificados os fundamentos históricos da utilização da holding para organização empresarial e sua praticidade para a implementação de estratégias no campo da sucessão dos bens da família em favor dos herdeiros com significativa economia de custos, assim como forma de proteção patrimonial, passemos a entender como funciona a instituição da holding familiar.

Como é o desenvolvimento de uma holding familiar para planejamento sucessório

O desenvolvimento de uma holding familiar começa através de diálogos com o titular do patrimônio para entender quais bens possui, as suas necessidades e anseios no tocante à preservação e proteção do legado por ele construído em favor de seus filhos, o que possibilita compreender melhor também como funcionam seus negócios empresariais ou profissionais, e formular desta forma uma estratégia personalizada que sirva a demanda exigida pela família e que traga o melhor panorama aos filhos após o falecimento do pai/mãe de família ou de ambos.

Posteriormente, é criada uma empresa em que serão guarnecidos os bens da família, e que se converterão em cotas de capital social, e a partir disto, é feita a doação das cotas deste capital aos herdeiros (em casos raros, adota-se a compra e venda de cotas), e simultaneamente, são estabelecidas regras contratuais que permitem a continuidade da autonomia e independência do detentor deste patrimônio para agir como administrador, podendo residir em algum dos imóveis (através da instituição do usufruto) auferir alugueis e vender os bens sem a anuência dos herdeiros.

Ou seja, a pessoa que se desfaz de seu patrimônio, muito embora não mais possua os bens em seu nome, conforme registro formalizado em documentos públicos (contrato social arquivado na Junta Comercial e matrícula imobiliária no Cartório de Imóveis), na prática ele continuará agindo como se nada tivesse acontecido. Isso mesmo! O sistema de holding familiar permite que extraiamos as regras avançadas do contexto do mundo empresarial das grandes corporações para manter o patriarca/matriarca no controle de tudo, podendo até mesmo, se assim lhe convir, desfazer total ou parcialmente, o mecanismo de planejamento sucessório e voltar ao estágio como era antes. E se a ordem natural dos acontecimentos sair de maneira inesperada, como no caso de falecimento de filho antes do doador, este poderá reaver a parte que cabia ao herdeiro e redistribui-la aos filhos do falecido (seus netos) ou aos irmãos destes (seus filhos), conforme os aspectos práticos do caso, o que é realizado através da aplicação da cláusula de reversão.

Após a doação, uma preocupação corriqueira dos pais ou mães de família é a questão referente à comunicação dos bens com os genros ou noras, situação esta que é facilmente contornada através a instituição de cláusula de incomunicabilidade, pois independentemente do regime de bens adotado no casamento dos filhos, esta restrição resguardará de maneira totalmente segura que o patrimônio não sairá da mão dos filhos.

Há que se ressaltar também que o doador, mesmo não tendo mais as cotas do capital social da holding familiar, ficará atrelado a ela como administrador e mandatário, e deterá a plenitude dos poderes para deliberar sobre o rumo patrimonial da empresa, podendo até mesmo desfazer o planejamento sucessório por meio da ativação do call option, revertendo o patrimônio em seu favor, operação esta que não faz incidir impostos.

Todas as decisões, atos de disposição patrimonial e obtenção de ganhos financeiros decorrentes de alugueis, arrendamentos ou venda de imóveis ficarão centralizados na pessoa do doador enquanto estiver vivo, não necessitando da autorização de seus herdeiros, mesmo sendo estes os donos das cotas do capital social da holding familiar.

Holding familiar como mecanismo de proteção patrimonial

Outro ponto de vantagem da holding, além do planejamento sucessório, é a proteção patrimonial conferida através da transmissão de bens operada neste sistema, pois caso o doador seja, por exemplo, um empresário que aporta significativos recursos econômicos em uma determinada atividade, contratando funcionários, celebrando contratos com clientes e fornecedores, e, em um determinado momento no desempenho de suas atividades empresariais, acaba tendo algum infortúnio em decorrência de redução da procura pelos produtos/serviços, crises sanitárias que impõem lockdown (como foi o caso da pandemia COVID-19), inflação, aumento drástico dos custos de matéria-prima ou falta de incentivo do governo, ele se verá obrigado a encerrar suas atividades.

Como consequência prática da cessação das atividades do empresário, o mesmo terá que inevitavelmente paralisar ou rescindir contratos em curso e demitir trabalhadores, e neste panorama, certamente não terá recursos para pagar dívidas parceladas junto a bancos e verbas trabalhistas aos funcionários, o que implicará no ajuizamento de cobranças judiciais destas dívidas. E é aí que o desenvolvimento da holding entra como eficiente mecanismo de proteção patrimonial, pois se sua construção se der antes do surgimento destes momentos de crises econômicas, o empresário que se resguardou terá uma forte barreira para evitar que penhoras ou medidas judiciais de expropriação afetem seus bens para pagar os débitos.

Vale lembrar que a proteção de riscos e implementação de medidas para blindagem patrimonial do empreendedor não representam medidas ilícitas, pois a prevenção de possíveis perigos patrimoniais futuros está autorizada pela Lei de Liberdade Econômica – Lei n. 18.874/2019, que instituiu o artigo 49-A no Código Civil, que interdiz “a autonomia patrimonial das pessoas jurídicas é um instrumento lícito de alocação e segregação de riscos, estabelecido pela lei com a finalidade de estimular empreendimentos, para a geração de empregos, tributo, renda e inovação em benefício de todos”.

Ou seja, é direito dos empresários se valerem de mecanismos societários para eliminação ou abrandamento de riscos, e isto vem de boa pertinência pelos legisladores para estimular que mais pessoas possam empreender sem temer prejuízos futuros, visto que a criação de empresas estimula a economia por criar empregos, gerar renda e arrecadação de impostos.

Registre-se que a criação de instrumentos de proteção patrimonial não pode ocorrer após o surgimento das dívidas, pois restará induvidosamente caracterizada a fraude, o que inutilizará a eficiência da blindagem patrimonial.

Planejamento financeiro e tributário na compra e venda de imóveis, locações e arrendamentos

Destaque-se também que o desenvolvimento da holding pode auxiliar no desenvolvimento de estratégias para compra e venda de bens imóveis urbanos ou rurais, assim como locações, especialmente no que se refere à redução de impostos incidentes em tais operações imobiliárias, como se pode verificar na apuração do regime tributário adotado (lucro real ou presumido), na categorização contábil dos imóveis dentro da holding e das faixas de tributação sobre alugueis ou arrendamentos, que podem em alguns casos serem consideravelmente mais vantajosos do que o recolhimento de impostos na pessoa física. Um estudo detalhado e específico de cada caso poderá definir como a família poderá otimizar a economia no pagamento de impostos, especialmente em relação ao ITBI e imposto de renda.

Conclusão

Conclui-se assim que a holding familiar (assim como as holdings rural, médica e de participações) serve como um sofisticado e avançado recurso societário que traz as melhores estratégias quando o assunto é planejamento da sucessão dos bens sem a necessidade futura de passar pelo tortuoso inventário, proteção dos bens da família e de seus negócios, assim como meio para aperfeiçoar operações imobiliárias, trazendo em todos os casos significativa economia de recursos financeiros e organização de todos os assuntos que dizem respeito à segurança patrimonial.

Caso tenha interesse sem saber mais sobre o assunto ou pretenda fazer um estudo de viabilidade de implantação de uma holding familiar para planejar a sucessão de seus herdeiros em relação aos seu patrimônio, bem como protege-lo, contate-nos para que possamos lhe indicar o melhor caminho.

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