Dado o aumento cada vez mais ingente e copioso de situações atreladas à prática de fraudes no empréstimo consignado, o Poder Judiciário tem sido provocado a dar resoluções impositivas para dirimir as variadas repercussões que podem advir do cometimento de atos irregulares que resultem na imposição de desconto em folha nos rendimentos auferidos pelos pensionistas e aposentados, tanto os oriundos tanto do INSS,  quanto dos regimes previdenciários atrelados ao funcionalismo público.

Para melhor direcionamento de nossa abordagem, enfocaremos a questão envolvendo o INSS e as instituições bancárias, visto que, estatisticamente, os eventos atrelados à concessão de empréstimo consignado sem consentimento do aposentado ou pensionista, têm sido mais recorrentes, abrindo margem para inúmeras dúvidas quanto aos direitos do lesado em ocorrências tais.

Em sede inaugural, urge registrar que os bancos concedentes de empréstimos consignados, sem a coleta da concordância do beneficiário, respondem objetivamente pelos danos acarretados ao mesmo, ou seja, não se faz necessária a indagação se a instituição financeira agiu ou não com culpa, e isto justifica-se pelo fato de os bancos se sujeitarem às disposições previstas no Código de  Defesa do Consumidor, que prevê em seu artigo 14 a responsabilidade objetiva dos fornecedores de produtos e serviços em razão de danos acarretados ao consumidor. Ainda, de acordo com a Súmula n. 297 do Superior Tribunal de Justiça, tem-se como pacificada a questão atrelada à submissão das instituições financeiras à Lei n. 8.078/1990 (Código de Defesa do Consumidor).

Nesta toada, os tribunais pátrios, ao reconhecerem a responsabilidade das entidades concedentes de empréstimos consignados sem a solicitação do destinatário, têm firmado em uníssono orientação pacífica acerca da inexigibilidade do pagamento das parcelas programadas para o futuro, com a subsequente restituição dos valores pagos indevidamente, e, em determinadas hipóteses, até mesmo a devolução em dobro dos valores pagos indevidamente pelo prejudicado, conforme previsto no artigo 42 do Código de Defesa do Consumidor.

Todavia, a questão da condenação dos bancos ao pagamento em dobro dos valores descontados indevidamente da folha de pagamento do aposentado ou pensionista não tem sido pacífica pelos pretórios pátrios, havendo dissonâncias quanto aos critérios utilizados para aferir e legitimidade da condenação pecuniária neste patamar, e o posicionamento mais acatado é o que versa sobre as pautas elaboradas pelo Superior Tribunal de Justiça, como as estipuladas no bojo do REsp nº 1.032.952/SP,  AgInt no REsp 1449237/PR, que dizem respeito ao pagamento indevido e à má-fé da instituição financeira.

Quanto ao primeiro requisito, não há qualquer consideração a ser feita em razão da obviedade que o mesmo enuncia. Contudo, para a caracterização do segundo requisito, qual seja, a má-fé, o entendimento jurisprudencial majoritário, com esteio na mais abalizada ensinança dos jurisconsultos, deve ser entendida em contraposição à ideia da chamada boa-fé objetiva, que diz respeito não aos aspectos anímicos ou subjetivos do agente ao pautar sua conduta perante terceiros como sendo de boa índole ou de acordo com os bons costumes, mas sim de acordo com o que sua conduta se exterioriza diante dos sujeitos com quem estabelece determinada relação, de forma a evidenciar externamente se suas ações se correlacionam com a lealdade, probidade, retidão e honestidade por exemplo.

Para análise da violação ao postulado da boa-fé objetiva, é preciso se atentar para alguns detalhes relevantes e até mesmo um tanto intrincados, que só cada situação casuística poderá revelar mediante análise acurada dos fatos, que diz respeito à natureza do comportamento da instituição financeira diante da concessão de um empréstimo consignado fraudulento, como omissão deliberada diante de uma denúncia de operação creditícia irregular, inércia no atendimento aos reclamos do consumidor ou até mesmo consecução de medidas suasórias para cobrar a dívida contestada, pelo que nestes casos, caso efetivamente comprovados, os magistrados podem perfilham pelo reconhecimento da má-fé, e por consequência, no reconhecimento da necessidade de se condenar o banco a restituir em dobro os valores pagos indevidamente pelo aposentado ou pensionista.

Não se esqueça ainda que é uniforme a orientação de que a vítima destas fraudes pode ter a flexibilização do ônus da prova, na forma prevista no artigo 6º, inciso VIII, do Código de Defesa do Consumidor, especialmente quanto à comprovação dos dados fáticos subjacentes à formalização do empréstimo consignado, até mesmo porque seria de todo absurdo exigir do prejudicado a demonstração de que não contratou o serviço, tratando-se assim de prova impossível, o que justifica, dada a dificuldade de acesso a elementos de convicção que o aposentado ou pensionista pode enfrentar, a distribuição mais equitativa dos encargos probatórios entre os litigantes.

Já que no que versa sobre a responsabilidade do INSS, o artigo 37, § 6º, da Constituição Federal preconiza a responsabilidade civil objetiva das pessoas jurídicas de direito público, como soa ocorrer com a referida entidade, posto se tratar de autarquia federal, pelo que a vinculação da mesma na responsabilização pelos danos ocasionados aos beneficiários de pensão ou aposentadoria não suscita maiores divagações, mormente porque decorre ex lege sua atribuição no gerenciamento, autenticação, análise e controle das solicitações feitas pelas instituições financeiras para aprovação dos descontos para custeio de empréstimo consignado.

A esse respeito, pode-se invocar o disposto no artigo 6º, § 2º, incisos I e II, da Lei n. 10.820/2003, in verbis:

Art. 6º. Os titulares de benefícios de aposentadoria e pensão do Regime Geral de Previdência Social poderão autorizar o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS a proceder aos descontos referidos no art. 1o desta Lei, bem como autorizar, de forma irrevogável e irretratável, que a instituição financeira na qual recebam seus benefícios retenha, para fins de amortização, valores referentes ao pagamento mensal de empréstimos, financiamentos e operações de arrendamento mercantil por ela concedidos, quando previstos em contrato, nas condições estabelecidas em regulamento, observadas as normas editadas pelo INSS. 

§ 2º. Em qualquer circunstância, a responsabilidade do INSS em relação às operações referidas no caput deste artigo restringe-se à: (Redação dada pela Lei nº 10.953, de 2004)

I – retenção dos valores autorizados pelo beneficiário e repasse à instituição consignatária nas operações de desconto, não cabendo à autarquia responsabilidade solidária pelos débitos contratados pelo segurado; e

II – manutenção dos pagamentos do titular do benefício na mesma instituição financeira enquanto houver saldo devedor nas operações em que for autorizada a retenção, não cabendo à autarquia responsabilidade solidária pelos débitos contratados pelo segurado.

Saliente-se que o INSS tem integralmente sua esfera de atribuições na gestão e implementação das consignações deferidas em lei, extraindo-se daí a responsabilidade que possui na checagem da autenticidade das informações a si repassadas, pelo que, diante de eventual desídia ou omissão no controle no lançamento de dados, obtidos por meio de erro ou fraude. Ainda, a Instrução Normativa 121 de 2005 estabelece que os empréstimos consignados devem ser aceitos caso sejam requeridos por escrito ou mediante comunicação eletrônica, não se admitindo a modalidade telefônica, observando-se ainda a obrigatoriedade de a instituição financeira ser conveniada ao INSS, bem como verificação da autorização expressa pelo mutuário para a percepção do empréstimo consignado, pelo que a violação destas cautelas agregará na responsabilização da autarquia federal.

Lembre-se ainda que a competência para apreciação de demandas desta natureza é da Justiça Federal, por conta do previsto no artigo 109, inciso I, da Constituição Federal, tendo em conta a vis attractiva da referida ramificação do Poder Judiciário brasileiro para apreciar processos em que o INSS figure como réu, pelo que é preciso a formação de litisconsórcio passivo entre a referida entidade e a instituição financeira encarregada pela cominação do empréstimo consignado descabido.

Além do mais, registre-se que o aposentado ou pensionista pode ser indenizado por danos morais acarretados em virtude da concessão indevida de empréstimo consignado, sendo recorrente decisões de magistrados e desembargadores integrantes dos Tribunais Regionais Federais a inclinação do reconhecimento dos danos desta natureza à guisa de maiores digressões acerca dos fatos concretos, haja vista o caráter presumível da violação à dignidade da pessoa que se pode extrair em virtude da vivência de situações anômalas e desgastantes como estas, podendo ocorrer, entretanto, oscilações quanto à delimitação do quantum indenizatório, a depender da comprovação de particularidades que tenham contribuído para o incremento do sofrimento experimentado pelo aposentado ou pensionista para além dos transtornos que são inerentes a este tipo de situação, como perda de uma chance, privação do custeio de uma necessidade emergencial, etc.

Estes são, em suma, os aspectos mais cadentes e pronunciados da resolução judicial de conflitos voltados à concessão desautorizada de empréstimos consignados em detrimento de aposentados e pensionistas. Caso tenha dúvidas, contate-nos para esclarecermos sobre seus direitos caso se enquadre nesta situação.

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